13 novembro 2009

Um dia de Geisy

Minha vida não é muito fácil. Minha família é pobre, eu trabalho em um mercadinho pra ajudar meu pai a pagar minha faculdade (R$300,00 de mensalidade, o que pra mim é muito). Não sou bonita, mas sou bem gostosona. Pinto o cabelo de loiro porque acho que combina com o meu jeito. Às vezes eu gosto de me arrumar pra ir à faculdade, eu gosto que olhem pra mim. E que mulher não gosta? As meninas do curso de Educação Física, por exemplo, ficam sempre com o uniforme: shortinho e top. Também quero me sentir desejada de vez em quando. Que mulher nunca se empinou um pouco pra passar na frente do quartel e escutar um fiu-fiu? Claro, algumas cantadas são muito grosseiras, mas é deprimente passar em frente de obra e quartel sem escutar um elogio. Hoje tô a fim de ir pra faculdade vestida pra matar. Consegui juntar uma graninha nos últimos meses, comprei um vestidinho rosa lindo, e é com ele que eu vou!



É meio curto, mas nada fora do normal que vemos pela rua. Vou brincar de desfile e de sessão de fotos, vou acenar como miss, quero me divertir! Afinal, o intervalo entre as aulas anda tão chatinho...

O final da história todo mundo sabe.

Só assisti dois programas que debateram o assunto. O Saia Justa, que foi genial, e o do Lobão, na MTV. No Saia, a conclusão é: o problema não foi a minissaia, mas sim a falta de culhão. Explico: vivem dizendo que a mulher tem que ser independente, segura de si, bonita e gostosa? Pois é. Toda capa de revista vende isso. Aí uma menina do povo, filha do Zé Ninguém, assume esse papel d’A Segura e é apedrejada?



No Lobão foi mais ou menos a mesma coisa. Duas estudantes da UNIBAN reafirmando a qualidade do ensino da instituição e insistindo que “a Geisy ficou desfilando pela faculdade, atraindo atenção”. Ah tá, que mulher não gosta disso? Me apedreja então, pois sempre dou um jeito de evidenciar algum ponto forte do meu corpo. Uso vestido curto, blusa decotada, short, minissaia.

Não há o que desculpe o comportamento dos colegas de faculdade. Mais imperdoável ainda foi a atitude dAs colegas, chamando de puta e vagabunda. Sempre achei que mulher tem que ser unida, uma batalhar pelo direito da outra, mas o que sempre se vê é a inveja e o despeito.

Sobre a “força da massa” (só tentaram comer e xingaram porque mais gente fazia a mesma coisa, cada um isoladamente não teria culhão ou peito pra fazer isso), acho que os brasileiros estão com os valores “desvalorizados”. Os traficantes derrubaram um helicóptero e isso só deu ibope por dois dias, e o povo não se mobilizou. Mas a Cica tirou o youtube do ar, isso é imperdoável! Uma mãe foi morta com a filha nos braços, isso rendeu 3 minutos no Jornal Nacional. Mas as bilheterias pro jogo do Vasco demoraram a abrir, chama o Ministério Público!



Vai ver as drogas e o futebol são mais importantes que a vida das pessoas. E a minissaia é mais ofensiva que as vagabas do Pânico fazendo um cara beber na noite paulistana pra depois levar pra casa em segurança.



Vou ali vestir uma burca, até mais.

8 comentários:

  1. Pra mim esse foi um dos comentários mais lúcidos sobre esse "caso", se é que se pode chamar de caso. Dispensa qualquer complemento!

    Vai lá, vestir a burka, que o TALEBAN tá vindo aí!

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  2. sabe o que eu acho dessa história toda?
    primeiro... na faculdade vc vai do jeito que quer e ponto, só não pode ir nu.
    segundo... a roupa que esse ornitorrinco foi não é pior do que muitas que eu ja vi por ai.
    terceiro... ela ja ganhou o que tanto queria, a fama. espero que saiba usar.
    quarto e último... o país com tantos problemas pra resolver e a preocupação é a merda da roupa que essa coisa feia usa??? vão tudo tomar na PQP!!!

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  3. Realmente, caro "Idiotice", logo você que quer limitar a idiotice alheia, não botar limites na sua própria é um absurdo.

    A PIOR atitude do Brasil foi a que vc acabou de transmitir: um país com tanto problema não deve se preocupar com assuntos, digamos, menores.

    E aí, um dia, os problemas menores viram uma bola de neve.

    Geisy é uma menina pobre, acostumada a usar aquelas tranqueiras num sambão. Ninguém na sua família provavelmente foi à universidade. Ela é a primeira. E portanto não há cultura de se portar em certos ambientes pq simplesmente por séculos eles nunca os freqüentaram.

    Não, o texto de Ana não é um dos mais lúcidos a respeito. É um dos mais comuns.

    Tenho um corpo perfeito, sou magra, alta, esguia, coisa que Geisy não é. Mas não mostro meu corpo por aí. Que mulher não gosta de se mostrar e passar em frente de obra? Eu, e muitas. Pelo amor de Deus, cantada de OBRA???

    Mesmo assim, não preciso de vestidinho curto pra que, por pouco ou nada, alguém solte uma ofensa por aei, nas mais diversas situações.

    Portanto, estão querendo misturar as coisas, mas as coisas são separadas.

    Geisy, além do mau gosto pra se vestir e da pouca consciência corporal, não tem semancol, não sabe se portar em ambientes com os quais realmente não teve afinidade. ELA tem que saber que ELA tem que aprender, e não enfiar suas vontades goela abaixo das pessoas.

    Já a reação contra ela tem algumas partes.

    1- Que as pessoas estão de saco cheio de exibicionismo e a cultura da putaria, do "é bonito é pra se mostrar" (que curiosamente na verdade é extremamente machista pq só se relaciona ao corpo da mulher né?), e a geração de todas essas imagens do que têm do Brasil no exterior e que fazem com que, mesmo com uma burka, se eu disser que sou do Brasil, estarei inevitavelmente associada a ser uma puta, me olham de cima pra baixo, de baixo pra cima com olhares lascivos, é HORRÍVEL.

    2-Homens nem deveriam opinar. Homens deveriam é não fazer que fizeram com a Geisy. Homens não sabem o que é ser (des)tratada como puta, gratuitamente.

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  4. 4-Vcs e a mídia estão dando mais munição pra Geisy demonstrar que REALMENTE ela é uma pessoa que não gosta de se corrigir, de se adaptar. E isso dá mais força ao argumento da Uniban, de que ela foi alertada muitas vezes sobre a adequação de sua vestimenta ao ambiente e não se adaptou. Ela sofreu sim, mas está ADORANDO aparecer. Então é o que ela gostava desde o começo. A máscara dessa história está caindo. Era uma coisa muito simples que ela poderia ter evitado.

    5- Mas realmente ela não poderia ter evitado a reação cavernícola da meninada. Mas sinceramente, uma pessoa que se veste assim não está já acostumada a ser chamada disso? Vcs realmente acham que não??? Como disse, eu não uso roupas assim, mas se reclamo de não poder entrar com minha água num show, já fui chamada de puta e o cara me mandou dar uma voltinha pra "resolver a situação". Acham isso aceitável???

    6- A maioria das pessoas que defende Geisy não se veste como ela, não sabem o que é estar na pele de um vestido daquele e nem aceitariam sua namorada (homens) ou suas filhas ou elas mesmas (mulheres) se vestissem assim. Estão defendendo o quê, então?

    7-Acho que o Brasil tá cansado desse discurso permissivo e existe uma coisa chamada "contenção social" sim. Eu não me tatuei nem espetei o cabelo nem raspei a cabeça nem fui trabalhar com a camiseta do Metallica quando eu tinha 18 anos. Portanto ninguém realmente veste o que quer onde quer quando quer. Há regras sociais e no fundo que bom, pq hj eu mudei e odiaria minhas tatuagens. Talvez ainda faça alguma, mas certamente não as que teria feito antes.

    8-Brasileiro adora desrespeitar qq regra e classe média adora defender pobre em coisas que a classe média está LOOOOONGE de fazer. Mas defende que os outros façam. A interpretação que a classe média deu ao caso, NAO É a que a Geisy teve.

    9- Pra mim, a Geisy só veio com essa história de machismo pq a coisa caiu no YouTube. Pq caralhos ela foi com aquela roupa?

    10-Viram o guarda-roupa dela ontem no Fantástico??????? Não há nada apresentável ali, em qq país que ela desfilasse com aquilo teria a mesma reação cavernícola. E francamente, viram no mesmo Fantástico o quanto ela está adorando aparecer em todos os programas? "Playboy Geisy?" Resposta: "Não, AINDA não". Como assim, nenê? Até ontem vc nõa era ninguém. Se aceitar Playboy a Uniban acaba de vencer a história.

    11-E no máximo a garota é brega, não puta.

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  5. Isso me lembra uma musiquinha;

    Chico Buarque - Geni e o Zepelim

    De tudo que é nego torto
    Do mangue e do cais do porto
    Ela já foi namorada
    O seu corpo é dos errantes
    Dos cegos, dos retirantes
    É de quem não tem mais nada
    Dá-se assim desde menina
    Na garagem, na cantina
    Atrás do tanque, no mato
    É a rainha dos detentos
    Das loucas, dos lazarentos
    Dos moleques do internato
    E também vai amiúde
    Co'os velhinhos sem saúde
    E as viúvas sem porvir
    Ela é um poço de bondade
    E é por isso que a cidade
    Vive sempre a repetir
    Joga pedra na Geni
    Joga pedra na Geni
    Ela é feita pra apanhar
    Ela é boa de cuspir
    Ela dá pra qualquer um Maldita Geni
    Um dia surgiu, brilhante
    Entre as nuvens, flutuante
    Um enorme zepelim
    Pairou sobre os edifícios
    Abriu dois mil orifícios
    Com dois mil canhões assim
    A cidade apavorada
    Se quedou paralisada
    Pronta pra virar geléia
    Mas do zepelim gigante
    Desceu o seu comandante
    Dizendo
    - Mudei de idéia
    Quando vi nesta cidade
    Tanto horror e iniquidade
    Resolvi tudo explodir
    Mas posso evitar o drama
    Se aquela famosa dama
    Esta noite me servir
    Essa dama era Geni
    Mas não pode ser Geni
    Ela é feita pra apanhar
    Ela é boa de cuspir
    Ela dá pra qualquer um Maldita Geni
    Mas de fato, logo ela
    Tão coitada e tão singela
    Cativara o forasteiro
    O guerreiro tão vistoso
    Tão temido e poderoso
    Era dela, prisioneiro
    Acontece que a donzela - e isso era segredo dela
    Também tinha seus caprichos
    E a deitar com homem tão nobre
    Tão cheirando a brilho e a cobre
    Preferia amar com os bichos
    Ao ouvir tal heresia
    A cidade em romaria
    Foi beijar a sua mão
    O prefeito de joelhos
    O bispo de olhos vermelhos
    E o banqueiro com um milhão
    Vai com ele, vai Geni
    Vai com ele, vai Geni
    Você pode nos salvar
    Você vai nos redimir
    Você dá pra qualquer um Bendita Geni
    Foram tantos os pedidos
    Tão sinceros tão sentidos
    Que ela dominou seu asco
    Nessa noite lancinante
    Entregou-se a tal amante
    Como quem dá-se ao carrasco
    Ele fez tanta sujeira
    Lambuzou-se a noite inteira
    Até ficar saciado
    E nem bem amanhecia
    Partiu numa nuvem fria
    Com seu zepelim prateado
    Num suspiro aliviado
    Ela se virou de lado
    E tentou até sorrir
    Mas logo raiou o dia
    E a cidade em cantoria
    Não deixou ela dormir
    Joga pedra na Geni
    Joga bosta na Geni
    Ela é feita pra apanhar
    Ela é boa de cuspir
    Ela dá pra qualquer um Maldita Geni

    Esta letra foi retirada do site www.letrasdemusicas.com.br

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  6. Oi Anônima alta, magra e esguia! Coincidência ou não, também sou alta, magra e esguia. Bom, um pouco menos esguia aos 4,5 meses de gestação.
    Concordo, meu texto é dos mais comuns. Incomum foi seu comentário, pertinente, bem escrito, com excelentes argumentos. pena que não foi assinado!
    Sou gaúcha, moro na Bahia há 5 anos, impossível não usar roupas que mostrem alguma parte do corpo. A questão é como vc se porta, não o que veste. Dá pra ser digna de biquíni, dá pra ser uma puta de burca.
    Não vi o Fantástico, não perderia meu tempo com o guarda-roupas da Geizy (sei lá como diabos se escreve o nome dela). Também não fui ao show do Troco, aqui na cidade, onde a Professora Jaqueline deixa o "cantor" enfiar a mão e puxar sua calcinha até que os pequenos lábios sejam separados. E a plateia aplaude enlouquecida!
    Entendeu o ponto? Por que a minissaia vale a celeuma e a professorinha não? É por ser paga pra isso?
    Eu tb já tô de saco muito cheio dessa discussão e dessa loira.
    Então chega, né?
    Obrigada por sua visita e por suas palavras!

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  7. Ah, sim, também tenho nojo de cantada de obra ou quartel, mas adminto que, se não soa nenhum fiu-fiu, o pensamento é "ué...". Mas isso não me faz trocar de roupa ou atitude, aliás, me faz pensar que acertei.

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